... nunca mais eu quis saber de
futebol, de mais nada... -
2006
*
Série baseada nos depoimentos de adolescentes internados em instituição por
infringirem as leis.
Texto bordado em
torno da peça: Quando eu era
pequeno me pai me levava sempre pra ver ele jogando no campinho. O sonho do meu
pai era ser jogador de futebol... Aí ele morreu com um tiro da polícia, na guerra do
morro, tava vindo do trabalho... Nunca mais eu quis saber de futebol, de mais
nada. Cresci revoltado, sangue frio, entrei pro crime... Meu pai era tudo pra
mim...
Durante 3
anos (2000 a 2003), visitei adolescentes internados em instituição destinada à
recuperação de jovens que infringiram as leis. No início, o que pretendia ser
uma pesquisa, passou a caracterizar meses de convivência diária, diálogos,
trocas culturais e afetivas.
Experimentando
uma proposta inédita e completamente desconhecida por mim, várias obras
surgiram durante este período. Todas com base nas conversas e trocas
estabelecidas com os adolescentes. Uma delas é a instalação: “… uma história que
você nunca mais esqueceu?”
Diante de
tantas histórias vividas (desde a violência doméstica e a do dia a dia nas ruas;
traumas, sentimentos de traição, agressões - e até mesmo alegrias e histórias de
amizade e solidariedade...) minha curiosidade era se eles haviam guardado aquela
história que nunca mais esqueceram. Depois de muitos encontros estas histórias
foram surgindo recuperadas de suas memórias, e a cada dia mais adolescentes
tinham interesse em me conhecer e conversar.
Nos
trabalhos desta série criei cenas baseadas nas respostas dos jovens do que para
eles era impossível esquecer.
Conheci mais de 100
meninos. E ouvir cada história individualmente me fez perceber o quanto estava
sendo importante nossa troca. Naquele lugar, sozinha, entendi que se houvesse
uma verdadeira intenção de transformação pelas intuições, estudar cada caso
separadamente, cada história de vida, seria a grande oportunidade para que eles
pudessem ter suas vidas reconstruídas.
De minha
parte entendi que depois de criar vínculos e estar tão presente no cotidiano
diário, não poderia ir embora e desaparecer de repente. Decidi então continuar
na instituição até que o último adolescente que eu havia conhecido
individualmente tivesse sido posto em liberdade. Para que não experimentassem
mais uma vez o sentimento de abandono constante em suas vidas.
Após a realização das obras, já envolvida e inserida naquele contexto junto aos adolescentes e os profissionais que lá trabalhavam, continuei frequentando a instituição desta vez como voluntária e criando propostas inéditas que surgiam de nossas trocas.
Após a realização das obras, já envolvida e inserida naquele contexto junto aos adolescentes e os profissionais que lá trabalhavam, continuei frequentando a instituição desta vez como voluntária e criando propostas inéditas que surgiam de nossas trocas.
Experimentar
este processo na arte e na vida foi inesquecível e a partir dele pretendo dar
prosseguimento a proposta de viver a arte como o encontro com o outro, na
tentativa de transformar as relações das pessoas diante de universos e questões
ainda tão desconhecidos.
Rosana
Palazyan, 2004
publicado em 23 junho de 2014